floquinhos

domingo, 16 de novembro de 2008

LEMBRANDO OUTROS DOMINGOS

Fico aqui, neste amanhecer cor de chumbo de domingo, nuvens escuras carregadas emoldurando as árvores já sem folhas que vislumbro aqui da minha janela, chuva grossa caindo sobre a cidade, uma certa e indecifrável tristeza oprimindo meu coração, não sei se saudades, não sei se apenas efeito do tempo, sem a menor perspectiva para o dia de hoje, buscando no meu baú de memórias alguns outros domingos que me couberam semelhantes a este e acabo me convencendo de que melhor seria buscar domingos mais alegres, domingos que me envolveram com a típica alegria que bailava entre as paredes do velho casarão, quando já quase saindo da adolescência a vida fazia de meus domingos dias de luz, ainda que plúmbeos como o de hoje. O despertar já com uma canção nos lábios, o preparar-me para ir a missa antes mesmo do café da manhã, porque a comunhão exigia jejum, e com que apuro eu me preparava para a missa! Vestido bem comportado, não se ia a igreja vestindo calças compridas, nem nos permitiam decotes ou blusas sem mangas. Sapatos sempre de saltos altos e meias, claro, aquelas meias com costuras, que eram perfeitamente alinhadas nas pernas, ainda presas por ligas, e o fio não podia estar torto; se levasse bolsa, deveria combinar com os sapatos. O missal, o terço... Brincos, anéis, colares, o que usasse deveria ser discreto, afinal igreja não era lugar de exibicionismos (rs), mas era a Casa de Deus e ninguém ia visitá-lo em Sua casa se não estivesse vestido adequadamente (como se Deus se preocupasse com isso!). Minha irmã já era casada por esse tempo, casou-se quase menina, um casamento desastroso que mereceria muitos capítulos a parte nas histórias que guardo nas minhas memórias, então íamos a missa minha prima Belinha e eu. Cumpríamos o ritual com muita contrição, muita fé e saíamos da igreja com a alma leve. A volta para casa era outro ritual, porque ao invés de tomarmos logo a Rua Piratininga, que começando em frente a igreja nos levava direto a rua Campos Salles, dávamos uma volta, íamos pela Rua Caetano Pinto. E tínhamos uma razão (deliciosa) para isso. Os churros que eram vendidos numa pequena casa dessa rua e que eram levados correndo para nossa mesa e devorados com o café-com-leite quentinho que já nos esperava prontinho. Diferentes dos que são vendidos hoje, eram salgados, sem recheio, fritos numa espiral, numa roda grande, realmente deliciosos, mas como toda fritura, tinham que ser comidos quentes, por isso a pressa em chegar em casa. Hummm... só de lembrar fico com uma fominha!... rs...
Depois do café minha mãe ia para a cozinha preparar o almoço que lhe tomava toda a manhã, porque almoço de domingo era sempre especial e o dia das moças era ocupado com doces amenidades, conversas entre amigas, ouvir música, ler, e depois do almoço havia a matinée num dos cinemas do bairro, ou um passeio num parque, ou ainda um joguinho de peteca ou tamborete ali mesmo, na rua, em frente a casa, o alegre bate-papo, sentadas na soleira da porta, e a noitinha, talvez, umas voltas pela Avenida, um passeio de mãos dadas com o namoradinho (isso se o tivesse...rs) e as nove da noite, todas recolhidas as suas casa, porque "moça de família" não ficava na rua depois dessa hora... rs... Ah! delicia de domingos... com gosto de churro feito com carinho por aquele casal de espanhóis, com aroma de saudades de um tempo que ainda mora dentro de mim...

Dulce/novembro de 2008

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