floquinhos

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Ainda guardo meus sonhos...


Na madrugada, caminho insone pela casa que está envolta em silêncio. A noite foi longa e esta quietude me apraz porque me permite estar comigo mesma... Porque me permite ouvir meus próprios pensamentos, esmiuçar meus mais profundos sentimentos, mergulhar lá no fundo de minh’alma para, ao emergir, trazer comigo sonhos escondidos e desesperançados. E o que seria de nós, pobres e indefesos seres diante de tantas adversidades que a vida nos impõe, se não tivéssemos a capacidade de sonhar? E são tantos e de tão variadas formas os sonhos que trazemos dentro de nós!... Pessoas ambiciosas têm sonhos de riqueza, de poder, megalomaníacos sonhos de dominar o mundo, enquanto que almas simples sonham apenas e simplesmente com a quietude e a paz do próprio coração... mas são, uns como outros, alentos que os ajudam a viver e a preservar seus sentidos, a traçar seus caminhos. E porque seria eu diferente? Sou, como todos, sonhadora. Acho até que a vida exagerou na parte que me coube nessa divisão de sentimentos e me cobriu de uma forte, uma imensa capacidade de amar, escondeu lá no fundinho de meu coração uma fonte inesgotável de carinho e ternura que, por mais que eu distribua, por mais que dela faça presente às pessoas que considere especiais, continua jorrando dentro de mim com tal força que por vezes parece querer explodir dentro do meu peito para poder finalmente ganhar a liberdade porque, como se costuma dizer, carinho demais sufoca, a quem recebe e a quem tem para dar... E antes que tudo isso convulsione ainda mais minha vida, estou partindo minhas amarras e libertando esse excesso de sentimentos que trazia represados dentro de meu peito. Estou redirecionando meus caminhos e meus atos. Estou tentando encontrar a justa medida para cada um de meus passos. Estou colocando meus pés no chão e embalando parte dos meus sonhos mais loucos para guardá-los em um bauzinho dentro de minha alma, escondidinhos bem lá no fundo, de onde ninguém possa alçá-los, onde fiquem protegidos da maldade e da infidelidade, do descaso e da traição, sentimentos tão tristes, que doem muito mais do que golpes de afiados punhais... Guardo meus sonhos loucos, meus desvarios, junto às minhas ânsias incontidas, às minhas grandes frustrações... deixo comigo, como parte de mim mesma, apenas singelos sonhos cabíveis e aconselháveis a quem transita pelo outono da vida e precisa alicerçar seus passos em caminhos mais amenos, menos tumultuados, a quem precisa aquietar um coração que ainda não aprendeu que certos sentimentos trazem muito mais dor do que prazer e mister se faz evita-los. Permanece também comigo, e disso não abro mão, a lembrança do mais louco e mais doce sonho que por anos embalou minha vida, norteou meus passos, fez de mim uma mulher de alma e coração abertos. Um doce sonho que me fez perceber que ainda tinha em mim uma imensa capacidade de amar, envolvendo-me numa maravilhosa sensação de juventude, de plenitude que nem em meus verdes anos conhecera. E como foi louco, como foi audacioso esse sonho!... Em sua insanidade, percorria vales e montanhas, atravessava oceanos, rompia barreiras e convenções, cego e alheio a tudo que se passava ao seu lado, voltado apenas para o objeto de seu carinho, para a alma que finalmente reencontrara, alma perdida na imensidão de tantas vidas... Sonho feito de ternura e transformado em lágrimas de ausência, de esquecimento talvez, em dolorido silêncio... Sonho que me acalenta nas soturnas madrugadas do outono de minha vida...

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