floquinhos

domingo, 30 de novembro de 2008

PORQUE HOJE E DOMINGO...


AS TRADICIONAIS MACARRONADAS DE DOMINGO

Hoje é domingo / pede cachimbo / cachimbo é de barro / bate no jarro...

A meninada lá da minha rua adorava recitar essa cantilena, que ensinei aos meus filhos, que adoravam também e, posteriormente aos meus netos, que virou, mexeu, estão repetindo, quer dizer, o Philip e o Alexander, porque os outros já não acham graça nenhuma nisso, pois “cresceram” e isso é coisa de criancinha... risos... Só vão se lembrar da cantilena quando, adultos, tiverem seus filhos, numa manhã de domingo... rs
Domingo era dia de cantilenas, domingo era dia de macarronada... E podia-se ir a qualquer das casas lá do velho Braz a hora do almoço que lá estava a maravilhosa travessa de macarronada acompanhada das “bracciolas”, das “polpetas” ou de um frango assado, tudo fumegante sobre a mesa. Minha mãe fazia ainda um macarrão com mariscos ou com camarões, “de babar”, e outras vezes, fazia a famosa macarronada com frango, quando as coxas de frango usadas para fazer o molho eram preparadas depois a milanesa... hummmm... O almoço de domingo, lá em casa, era fantástico. Principalmente quando ela cismava de acompanhar a macarronada (no caso feita “al sugo” com uns enormes e maravilhosos bolos feitos com massa de batatas, fritos em muito óleo, recheados com carne moída, o mesmo recheio que ela usava para os pasteis, que também eram divinos...
Por isso estranhei tanto os domingos depois que me casei. Meu marido, mineiro de boa cepa, exigia o feijão com arroz na mesa, de domingo a domingo. E foi difícil me acostumar sem as deliciosas e tão tradicionais macarronadas domingueiras. O domingo perdia a cara de domingo...O jeito era ser criativa e fazer do feijão de todo dia um feijãozinho diferente e melhorado aos domingos, e ai entrava o tutu de feijão, o feijão tropeiro, o feijão gordo (com lingüiça), a meia feijoada, enfim, dar ao prosaico feijão uma cara de domingo. E, aos poucos, ir introduzindo a macarronada, assim como quem não quer nada... rs... Meu marido olhava a pequena travessa de espaguete colocada sobre a mesa, ao lado do “feijão de festa” e resmungava – não sei que graça vocês acham nisso! Não sou italiano pra comer macarrão... rs... Mas a medida que os anos foram passando ele acabou experimentando e gostando e se apaixonando pela macarronada, mas por ironia do destino, já diabético e proibido de comer massas, o que me obrigou a tirar esse prato do cardápio até que surgiram os macarrões lights e ele podia comer um pouquinho, mas só um pouquinho e ele, um bom garfo a vida toda, não se conformava com isso., o feijão, o arroz, as massas, tudo restringido e depois, a medida que a doença foi se agravando, proibido, tendo que se alimentar apenas de verduras e legumes, carnes magras e peixes, um sacrifício para ele.
Hoje a macarronada já não é prato de domingo. A cidade mudou, sofreu novas influências, mudaram os usos e os costumes, São Paulo virou centro mundial de gastronomia, culinária virou moda e mania, com uma imensa variedade de sabores, mas ficou a doce lembrança daquelas maravilhosas travessas fumegantes de espaguete coberto com um molho que levava horas para ficar pronto e montanhas de parmesão ralado dando o toque final... Dá até para sentir o aroma!... Hummmm...

Dulce / novembro de 2008

sábado, 29 de novembro de 2008

NOSSA ARVORE DE NATAL


Aproveitando a presença das crianças em casa pelo feriadão do Thanksgiven, minha filha resolveu montar ontem sua árvore de Natal. Os kids deliraram com a idéia e pusemos mãos a obra. Com uma seleção de musicas de Natal colocada para tocar, o clima natalino foi se incorporando ao ambiente, as caixas trazidas do sótão foram abertas e um mundo multicolorido de bolas, estrelas, flocos de neve, bonequinhos, pingentes, foi se espalhando pela mesa e de lá para os galhos da árvore já armada e com os fios de luzes devidamente colocados em volta dela. Philip seguia a orientação da mãe, quanto a colocação dos enfeites, já o Alexander, voluntarioso como ele só, em seus sete aninhos de vida, achando que decoração de árvore é com ele mesmo, queria colocar só o que achasse bonito e aonde bem entendesse. Foi preciso muita “psicologia” para que ele se encaixasse no “contexto”... risos Mas uma bola dourada aqui, uma vermelha ali, uma azul acolá, e a cara do Natal foi se formando ali, naquele canto da sala entre as duas janelas. E enquanto montávamos a árvore minha filha e eu íamos contando aos meninos como eram os Natais de nossas infâncias, e eu dizia que, na idade deles, mal sabia o que era uma árvore de Natal, e que só bem mais tarde, já adolescente, foi que meu pai comprou nossa primeira árvore e era um pinheiro natural que íamos comprar numa chácara lá no bairro do Tatuapé, na semana do Natal, porque se comprássemos antes ela secaria e na noite de 24 de dezembro estaria feia demais. Contei que tínhamos poucos enfeites, bolas, pingentes, ponteira, tudo feito em vidro muito fino que se quebrava ao menor descuido e que colocávamos velinhas (de verdade) nela e essas velinhas eram acesas na hora da ceia. E minha filha lembrou da alegria que sentia, ela já adolescente, tantos anos depois, quando ajudava meu pai a montar ainda sua árvore, já bem mais sofisticada e já com as luzes multicoloridas,. Lembrou-se de como era gostoso quando meu pai pedia a ela para salpicar toda a árvore com floquinhos de algodão, dizendo que era a neve. Todos os meus filhos guardam essa lembrança e ainda hoje, quando monto minha árvore, meus filhos gostam de jogar uns “floquinhos de neve” nela... rs... É tão curioso isso. Meu pai nunca tinha visto neve em sua vida, nascera na Ilha da Madeira, fora pequenino para o Brasil, mas certamente a primeira árvore de Natal que vira fora em algum cartão, ou folheto talvez americano, aonde os White Christmas são tradição, então resolvera incorporar a neve a nossa arvore tropical.
E de bola em bola, de história em história, hoje, aqui em Winchester, uma quarta geração da família, representada pelo Philip e pelo Alexander, montou sua árvore de Natal. Mas sem os floquinhos de neve. Essa fica lá fora, cobrindo o gramado, as ruas, a cidade, permitindo-nos um Happy White Christmas.

Dulce / novembro de 2008

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

UM SONETO DE PABLO NERUDA


No te quiero sino porque te quiero
y de quererte a no quererte llego
y de esperarte cuando no te espero

pasa mi corazón del frío al fuego.


Te quiero sólo porque a ti te quiero,

te odio sin fin, y odiándote te ruego,

y la medida de mi amor viajero

es no verte y amarte como un ciego.

Talvez consumirá la luz de enero.
su rayo cruel, mi corazón entero,
robándome la llave del sosiego.


En esta historia sólo yo muero

y moriré de amor porque te quiero,

porque te quiero, amor, a sangre, y fuego.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

PLIMOTH PLANTATION - UM MUSEU VIVO







Estas fotos mostram a Plimoth Plantation, um museu vivo, que retrata a vida, o uso, os costumes tanto dos peregrinos quanto dos indios wampanoags, em seu dia a dia, no ano de 1627, sete anos depois dos peregrinos terem chegado a Nova Inglaterra, a bordo do Mayflower II. Uma reconstituição da Vila dos Ingleses e da Aldeia Indigena, com personagens vestidos a carater - sendo que os índios são realmente wampanoags - nos dá a exata medida de como era a vida desses pioneiros, de sua luta, suas dificuldades, sua fé, enfim.
Andar entre a vila e a aldeia é uma viagem maravilhosa no tempo, cenário do local e dos acontecimentos que deram origem ao THANKSGIVEN, o Dia de Ação de Graças comemorado hoje nos Estados Unidos e no Canadá.

HAPPY THANKSGIVEN


Desejando a todos um Feliz Dia de Ação de Graças.

No canadá e aqui nos Estados Unidos, comemora-se hoje o Thnaksgiven, O Dia de Ação de Graças.
Um dia consagrado ao agradecimento a Deus por tudo que se tenha conseguido durante o ano, um dia a ser passado entre a família e os amigos, comemorado com um jantar aonde são servidos o famoso peru e os "pratos da terra".
No link abaixo poderemos conhecer os fatos que deram origem a essa data.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

DONA PAQUITA: ELA FAZIA A DIFERENÇA...


Para Dona Paquita, com saudades...

Conversando com um amigo sobre a Espanha e os espanhóis, seu jeito de ser e de viver, seus costumes, sobre a atual posição do pais no mundo, acabei enveredando pelos caminhos de minha memória pessoal e trazendo até mim a doce e forte figura de Dona Paquita – Francisca Amélia Manchon de Carvalho. Uma mulher linda, numa linda mulher!
Eu a conheci já em sua maturidade, quando se mudou para o apartamento vizinho ao meu, na Mooca. Lembro do dia em que atendi a porta e dei com uma mulher de estatura mediana, cabelos grisalhos, encaracolados, rosto expressivo, sorriso amigo, lindos olhos verdes, que olhavam de frente, sem medo de refletir uma alma gentil, sofrida, sonhadora, cheia de esperança., que ao me ver foi logo dizendo: “Bom dia! Eu sou Dona Paquita, sua nova vizinha e estou muito feliz com isso...” Adorava fazer amigos e sua casa estava sempre cheia deles. E foi fazendo de cada novo vizinho um novo amigo.
Vivia com a única filha, Silvia, pessoa gentil, mas reservada, ao contrario da mãe tão expansiva, alegre, que gostava de cantar, de escrever poesias, de trocar correspondência, de receber para o chá da tarde, de contar suas histórias. E sua história era bem triste. Cedo perdera o marido e tivera que lutar muito para criar as duas filhas, trabalhando sempre, sem esmorecer nem perder a fé na vida e nos homens, mesmo quando uma de suas filhas também se foi. Contava que quase enlouquecera de dor, mas tinha ainda sua Silvia para cuidar e não podia se deixar vencer. Assim, foi em frente. E sua Silvia cresceu, fez-se mulher, dedicou-se ao trabalho, e mãe e filha foram assim vivendo, uma cuidando da outra. Mas parecia que o sofrimento daquela mulher não tinha bastado. Talvez um pior golpe lhe fora reservado e a vida golpeia sem pedir desculpas nem dar explicações. Achei que Dona Paquita não resistiria, que enlouqueceria. Sua Silvia, sua filha muito amada, a companhia de sua velhice, seu esteio, também se foi, assim, quase de um dia para o outro. Uma dor, a ida ao hospital, a constatação de um aneurisma, a infinita dor de uma mãe que perde a filha... E minha amiga vivia essa tragédia por segunda vez,. Quantas e quantas noites ouvimos seu choro desesperado através das paredes dos apartamentos, quantas noites ainda veio se abrigar em nosso carinho, em nossa amizade, alta madrugada, para não se sentir perdida no desespero. E mesmo assim, não perdeu a fé em Deus e nos homens. Ainda uma vez levantou a cabeça, enxugou as lágrimas e retomou seu caminho. Mudou-se para o interior, para uma casinha que a filha tinha comprado para elas e lá viveu fazendo amigos, ensinando a viver, por mais sete anos. Mas seu mundo estava mesmo lá na Mooca. Entre o Brás, aonde crescera, e a Mooca, aonde vivera a maior parte de sua vida. Não conseguia suportar a saudade dos amigos de lá, dos parentes que por lá ficaram, do seu mundo. Vendeu a casa, voltou para seu lugar. Alugou um outro apartamento no mesmo condomínio e voltou a nos dar alegria, a viver seu dia a dia entre seus velhos amigos.
Deixei o bairro, mas não perdemos contato. Várias vezes ela nos deu a alegria de sua presença em nossas tardes. Meu marido e eu a adorávamos e parecia que a recíproca era verdadeira, o que nos fazia muito felizes. Ela tinha um olhar meio maroto, as vezes, sempre brincalhona, ia chegando em casa e perguntado “Cadê o meu James Bond?”. E meu marido abria os braços e um sorriso para recebe-la. Meu marido se foi, passei a viajar para estar com minha filha muitas vezes e nos víamos já mais raramente. Na volta de uma dessas viagens fiquei sabendo que ela também se fora. E nesse dia o mundo perdera um pouco do seu brilho, de sua cor, de sua musicalidade. O brilho dos lindos olhos verdes de Dona Paquita, a cor que sua presença emprestava a ele e a musicalidade de seu sorriso, de sua voz bonita, afinada, cantando canções que o tempo levou...

Dulce Costa / novembro de 2008

terça-feira, 25 de novembro de 2008

UMA AULA DE MUSICA RESGATADA NO TEMPO


Sempre tratei com respeito a passagem do tempo e vi com serenidade as mudanças que foram acontecendo em meu corpo. É a lei da vida. A lei que a grande maioria das pessoas não costuma aceitar muito bem e algumas delas até travam uma guerra feroz contra tais leis, nos salões de estética, nas academias, nos centros cirúrgicos em lipoaspirações, cirurgias, e tantos outros procedimentos que chegam, por vezes, a por em risco as próprias vidas dessas batalhadoras em prol da juventude eterna e da beleza.
Embora não faça parte dessa equipe, sei bem que manter um mínimo de atenção e cuidados para comigo mesma é o que se espera de qualquer mulher da atualidade. Alem do mais, o clima fica extremamente seco nos meses de outono/inverno, parece que a pele vai acabar rachando, se não for usado um bom creme para ajuda-la a passar essa temporada. Pensando assim, depois do banho matinal procuro sempre dedicar um tempo a esses cuidados e tento fazer desse tempo um momento agradável, um momento de boa musica.
Nesta manhã, a musica de Karajan enchia o quarto, penetrava-me a alma. E enquanto ia massageando levemente minhas mãos, meus braços, as pernas, o corpo ao som dessa musica ia sentindo um bem estar, uma paz incrível. O Barqueiro do Volga, com suas notas foi abrindo meu baú de memórias... Ah, lá vou eu caminhando pelo tempo... E encontrei-me, de repente, no andar superior da escola, na Carlos de Campos, no espaço dedicado as aulas de musica e entre minhas colegas acompanhava a aula. Lá estava o professor Miguel Izzo. Figura simpática, um homem de meia-idade, corpulento, estatura media, calvo, bigodes, óculos... Será que era mesmo assim? Ou o tempo distorceu sua imagem na minha memória? E ele ao piano, tocava O Barqueiro do Volga e regia o coral das meninas. Ali estavam pessoas que foram muito importantes para mim nessa fase de minha vida e que o tempo se incumbiu de afastar. Uma por uma elas foram se chegando... Daisy, amiga predileta, lindos olhos verdes, sonhadora, apaixonada, vivendo a paixão dos quinze anos... Elidia, lindos e encaracolados cabelos ruivos, tocava violino e deixava sempre uma aura de encantamento quando contava as apresentações do grupo, quando falava dos vestidos lindos de baile que usava, da maquiagem... usar maquiagem, para mim era quase um sonho. Esther, a bailarina, a enigmática menina que trazia nos olhos uma tristeza indisfarçável desde que os médicos a proibiram de dançar por um problema nos pulmões. Clara, uma alemãzinha (modo de falar, porque era bem alta) de cabelos muito louros e lisos, rosto marcante, olhar de criança, sorriso de mulher. Yara, a que viera do Rio (de Janeiro) e que soube se fazer amiga. Laís, a bela e estabanada Laís, parecendo sempre criança... Alcina... a linda Alcina. Beleza negra, pura, tão expressiva que o professor de cerâmica, um escultor, esculpiu-lhe um busto. E ficávamos do lado de fora da janela, observando seu trabalho, enquanto ela posava sem sequer olhar para o nosso lado para não rir, aquele seu riso branco, lindo, e assim atrapalhar o mestre em seu trabalho... e havia a Ruth, uma amiga muito especial, que não estava na minha classe, mas fazíamos o caminho de ida e volta a escola juntas, como a Zeza (Maria Olézia), éramos vizinhas e amigas... Ah, que saudades... Cada uma delas deixou em meu livro de recordações uma frase, um poema, um nome, uma amizade, uma saudade... Alguém escreveu qualquer coisa como: “Um dia, quando a neve do tempo tiver branqueado seus cabelos, ao abrir este livro de recordações, encontrará meu nome entre tantos outros...” e terminava com ...”espero não ter sido apenas um nome que ficou neste livro”.
Pois é, amigas, o tempo passou, a neve do tempo encobriu meus cabelos (mas fica escondida sob a tintura... rs) e devo reconhecer que a ação dos anos é, quase sempre implacável, Mas vocês são muito mais do que um simples nome num velho álbum de recordações. Vocês são parte de minha vida, vocês são doces lembranças de minha adolescência, vocês são saudades que eu gosto muito de sentir.

Dulce Costa / Novembro/2008

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

O OUTONO NO LAGO, NA VIDA...


A tarde estava fria, apesar do céu azul, sem uma única nuvem e do sol que se infiltrava por entre os galhos desfolhados das árvores, formando um cenário típico de fim de outono. As águas do lago estavam serenas e refletiam, como num espelho, a vegetação, o azul do céu.
Ela fizera o caminho da casa ao lago absorta em seus pensamentos, e só agora se dava conta da beleza do momento. Sentou-se num dos bancos do mirante e deixou-se ficar ali, tocada pela serenidade do local, tão distraída que nem percebeu a chegada dele. Um pouco sobressaltada respondeu ao cumprimento e assentiu com um leve movimento de cabeça ao pedido de licença dele para sentar-se ao seu lado. Seu nome era John e morava numa das casas ali do outro lado do lago. Vira-a outras vezes em suas caminhadas... e assim foi entabulando uma conversa agradável. A casa tinha ficado grande demais para ele apos a morte da esposa, já tinha pensado em se mudar para um apartamento, talvez em Boston, mas gostava tanto de lá que fora protelando a decisão. Apos a aposentadoria passara a escrever, costumava ousar fingir-se pintor, sempre havia um evento, uma exposição, um espetáculo para ir. Tentava manter-se ocupado, desfrutava do tempo que lhe restava com atividades que lhe dessem prazer, achava que o espírito tinha direito ao belo... e a conversa foi se estendendo, falaram dos filhos, dos amores que haviam partido, dos netos, da alma, da vida...
Quando se deram conta, a tarde caia e o anoitecer era rápido demais naquela época do ano. Percebendo que ela estava insegura em caminhar pelo bosque ao escurecer e querendo protelar um pouco mais a conversa, ele se ofereceu para acompanha-la até a casa. Foram caminhado lado a lado, apressando um pouco o passo para aproveitar o resto de claridade e, quando finalmente chegaram já era praticamente noite. Desculpando-se por te-la retido numa conversa sem fim, ao se despedirem, ele segurou docemente a mão dela entre as suas, causando em ambos uma sensação de conforto, de ternura.. Olhos nos olhos, sorrisos nos lábios, pressentiam que a solidão poderia ser menor dali para a frente...
Ao entrar em casa, fechando a porta atrás de si, ela sentia seu coração leve como há muitos anos não ousava ser. Ah, insano coração, ah, endoidecida alma... E cantarolando, dirigiu-se para a cozinha, pois era hora de preparar o jantar...

sábado, 22 de novembro de 2008

UM RECADINHO PARA MINHA NETA

Minha neta e eu

Amanhã minha neta enfrenta seu primeiro grande desafio: a primeira fase do Vestibular da FUVEST!!! Mas se ontem mesmo era o pai dela quem estava ali, ansioso, nervoso, as voltas com os livros e as apostilas... Bom, parece mesmo que foi ontem! Seu rosto trazia expectativa, seus olhos mostravam ansiedade. E antes de sair eu o abracei com carinho, e fiquei ali, todo o tempo, com o pensamento voltado para ele e para Deus. Para ele porque coração de mãe não tem outro jeito de ser. Para Deus apenas pedindo que o abençoasse e que lhe desse a calma e o discernimento necessários para fazer uma boa prova. Depois, a noite, a publicação das notas de corte e a esperança, quase certeza, de que ele conseguira. Depois a certeza, e depois a segunda fase, essa sim mais complexa, mais difícil. E quando as notas saíram a alegria de vê-lo entre os novos alunos da Faculdade de Medicina da USP. Nos olhos dele, uma imensa alegria e a esperança no futuro, a realização do sonho. Nos meus olhos banhados de lágrimas, a alegria de ver meu filho feliz, o orgulho de ser sua mãe, a esperança em seu futuro. E vieram então os anos universitários, os estágios hospitalares, os anos de residência, o início de uma carreira que o conduziu a um patamar respeitável, que fizeram dele um profissional competente, um homem que segue por seus caminhos com segurança e responsabilidade.
E amanhã será a vez dele e da Marta passarem pelas emoções que Bira e eu passamos. Amanhã minha neta, Ana Beatriz, a nossa Bia, enfrenta a primeira fase da FUVEST. Ela escolheu letras. Pretende enveredar pelos caminhos da literatura, talvez, seguindo a pequena e imperfeita semente que a avó plantou num pequenino jarro colocado a um canto da janela. Ou, quem sabe, voltar-se para o jornalismo que seria, pelo seu caráter, um jornalismo sério, responsável. Seja qual for o caminho que ela escolher, tenho certeza quê o trilhará com responsabilidade, criatividade, seriedade e respeito, porque é assim que ela caminha pela vida.
Neta muito querida, estou aqui, muito longe fisicamente, mas ao seu lado espiritualmente, o tempo todo, como estive ao lado de seu pai e de seus tios em cada um dos momentos deles. Torço por você, peço a Deus que a abençoe e que lhe de calma e discernimento na hora da prova, porque o resto está em suas mãos. E tenho certeza que está em muito boas mãos. Vá em frente e boa sorte.
Et n’oublies pas que je t’aime....
Com carinho,

Vó Dulce

A BARCA DOS MEUS SONHOS


Acordo com o quarto ainda em penumbra e posso ouvir o barulhinho da chuva lá fora.Lembro-me que é sábado e isso me permite até uma certa preguicinha a pedir-me que continue entre os lençóis, no aconchego de minha barca-cama, parafraseando meu amigo José Castillo, lá de Guadalajara, que usa com muita propriedade esse termo para definir o local aonde um mundo de sonhos vêm povoar sua mente enquanto está ainda desperta e que o levam como numa embarcação para lugares e tempos inimagináveis, que o transportam através de ares e mares por continentes distantes, que o aproximam de almas afins.
Navegando nessa barca, lá vou eu em busca de meus sonhos, também! E como num passe de mágica, atravesso o oceano; estou a seu lado, caminhamos juntos por sobre a areia molhada de uma praia deserta ao entardecer, mão na mão, olhos nos olhos, sorrisos a iluminar-nos os rostos, ternura a apascentar-nos os corações... O mundo está em harmonia com a vida. Não há guerras no Oriente nem medos no Ocidente; crianças não crescem abandoadas nas ruas de Sampa nem morrem de fome lá nos confins do continente africano; a alma humana é sincera e o homem cumpre seu destino com honradez e discernimento... Nesta minha barca, tudo é permitido, portanto, meu mundo precisa ser perfeito para receber você, para abrigar seu doce coração de cavalheiro.
E caminhamos em silêncio pela praia sentindo a água escorrer por entre nossos pés num ir e vir constante. Palavras são desnecessárias entre duas almas que finalmente se reencontram após séculos de ausência, de procura. Mas o telefone toca e me trás de volta à realidade da sua ausência, ao vazio da minha saudade, deixando em mim uma sensação de abandono, de “nunca mais”. Como se pudesse haver “nunca mais” para o que nem chegou a existir, para o que sempre foi apenas e tão somente a esperança de um dia “vir a ser”...
Como um autômato, vou até a janela e olho sem enxergar as gotas de chuva que escorrem pela vidraça. A cidade é toda cinza e parece tão triste, mas sei bem que sou eu quem está transferindo essa tristeza à cidade, tristeza que cobre meu coração nesta manhã de saudade.

Dulce Costa / dezembro de 2001

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

HOJE ACORDEI COM SAUDADES...

Eu era tão menina... Ele era meu super-herói... Saudades, pai!... saudades...

Acordei com saudades...
Saio da cama, vou até a janela, descerro as cortinas e dou com um amanhecer muito lindo, de céu azul, sem nuvens, com uma tênue luz rosada no pedaço do infinito que se pode ver por entre os galhos mais baixos das árvores desfolhadas. Meu coração está oprimido pela saudade. Sonhava com meu pai. Conversávamos enquanto caminhávamos pelo bosque e ele me falava da vida, contava=me coisas e riamos. Meu pai! Até hoje presente em cada um dos meus dias, tanto tempo depois de ter partido... Sua integridade, sua honradez, sua força foram palmilhando meus caminhos, numa preparação para que os seguisse sozinha e para que, quando chegasse esse momento, meus passos fossem firmes. Sempre foi o esteio da família e seus irmãos sempre tiveram nele o exemplo a ser seguido. E fico aqui lembrando dos dias de minha infância quando ele era o “super-homem”, sempre um pouco distante, como cabia aos pais de antigamente, meio inacessível, já que tudo era tratado com, e por, minha mãe no que se referia a educação das crianças, mas sabíamos que ele estava por detrás desse “tudo”. E lembro-me dele já fragilizado pela vida, caminhando seus últimos passos, ainda assim sem perder o ar altivo que lhe era natural, vendo já em seus olhos o temor tão natural dos que viajaram por longos caminhos, e que ele tentava não deixar transparecer para não nos preocupar. Vejo sua imagem física refletida em meu filho mais velho, em meu sobrinho também mais velho, e vejo neles também a força do caráter do avô, o que me deixa feliz. E fico olhando através da vidraça os primeiros raios de sol a se esparramarem por sobre a cidade... Hora de começar o dia. Fecho meus olhos e minha alma beija carinhosamente a fronte de meu pai, que me deseja bom dia e quando os abro de novo, estou pronta para seguir em frente neste caminho que ele aplainou para nós que tivemos o privilégio de chama-lo pai, avô, tio...

FLORBELA ESPANCA - FUMO



Longe de ti são ermos os caminhos,

Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,

Há dias sem calor, beirais sem ninhos!


Meus olhos são dois velhos pobrezinhos

Perdidos pelas noites invernosas...

Abertos, sonham mãos cariciosas,

Tuas mãos doces, plenas de carinhos!

Os dias são outonos: choram... choram...

Há crisântemos roxos que descoram...

Há murmúrios dolentes de segredos...


Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!

E ele é, ó meu Amor, pelos espaços,

Fumo leve que foge entre os meus dedos!...

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

AS PONTES SAO COMO PASSAROS...

Ponte 25 de Abril - Lisboa

Um lindo poema de THIAGO DE MELLO, um dos poetas de meu coração



Como nasce um vôo de pássaro
súbito e simples
(ninguém – talvez nem o próprio pássaro
- sabe jamais em que instante vai se erguer),
nascem também as pontes do coração
entre as criaturas humanas.
Nem sabem que vão nascer.

Pontes que são como os vôos
dos grandes pássaros belos,
são como os vôos das águias,
que certeiras e alto voam,
Perenes de sortilégios,
São como o vôo sereno
do condor pastando alturas

Também são como o dos suaves passarinhos,
em peleja pelo pão de cada dia;
vôo alegre e cristalino das asas amanhecendo,
Antes de tudo essas pontes
são como os vôos que chegam.
Chegam sempre.

Ainda que algumas se façam tardas,
jamais se fazem retardatárias,
Não sofrem de tempo as coisas
nascidas do coração.

Nascem as pontes e se alçam,
Certeiras de seus destinos
Como as águias de seus rumos
- e se vão, levando alvuras,
aconchegos, mansidões:
pontes de amor sobre um mundo
já quase alheio a milagres,
como um vôo de alvas asas
contra o azul já anoitecendo.

Por mais que muitos desabem
(acaso por desamadas),
embora tantas se calem
(talvez porque recusadas)
mesmo que muitas se percam
depois de perdido o pouso,
- nenhuma ponte de amor
se estende jamais em vão.
Pois algo sempre perdura
de tudo a que ela deu rumo:
seja um resto de recado,
um fragmento de canção
leve lembrança de alvura,
ou sejas apenas a sombra
de uma ternura. Pois algo
das pontes – feitas de infância
e de amor – sempre perdura.

Como contra o sol, o vôo
de um pássaro cuja sombra
se projeta e vai cavando,
bem de suave, um rastro eterno,
no manso verde do mar.

VINICIUS DE MORAES - Da Solidão

Sequioso de escrever um poema que descrevesse a maior dor do mundo, Poe chegou, por explosão, a idéia da morte da mulher amada. Nada lhe pareceu mais definitivamente doloroso. Assim nasceu "O Corvo": o pássaro agourento a repetir ao homem sozinho em sua saudade a pungente litania do "nunca mais". Será esta a maior das solidões? Realmente, o que pode existir de pior que a impossibilidade de arrancar à morte o ser amado, que fez Orfeu descer aos infernos em busca de Eurídice e acabou por lhe calar a lira mágica? Distante, separado, prisioneiro, ainda pode aquele que ama alimentar sua paixão com o sentimento de que o objeto amado esta vivo. Morto este, só lhe restam dois caminhos: o suicídio, físico ou moral, ou uma fé qualquer. E como tal fé constitui uma possibilidade - que outra coisa é a Divina Comedia para Dante, senão a morte de Beatriz? - cabe uma consideração também dolorosa: a solidão que a morte da mulher amada deixa não é, porquanto absoluta, a maior solidão...

Qual será, então? Os grandes momentos de solidão, a de Jô, a de Cristo
no Horto, tinham a exalta-la, uma fé. A solidão de Carlitos, naquela incrível imagem em que ele aparece na eterna esquina, no final de Luzes da Cidade, tinha a justifica-la o sacrifício feito pela mulher amada. Penso com mais frio n'alma na solidão dos últimos dias do pintor Toulouse-Lautrec em seu leito de moribundo, lúcido, fechado em si mesmo, e no duro olhar de ódio que deitou ao pai, segundos antes demorrer, como a culpa-lo de o ter gerado um monstro. Penso com mais frio n'alma ainda na solidão total dos poucos minutos que terão restado aopoeta Hart Crane quando, no auge da neurastenia, depois de se ter jogado ao mar, numa viagem de regresso do México para os Estados Unidos, viu sobre si mesmo a imensa noite do oceano imenso a sua volta, e ao longe as luzes do navio que se afastava. O que se terão dito o poeta e a eternidade nesses poucos instantes em que ele, quem sabe banhado de poesia total, boiou a esmo sobre a negra massa liquida, à espera do abandono? Solidão inenarrável, quem sabe povoada de beleza... Mas será ela também a maior solidão? A solidão do poeta Rilke, quando, na alta escarpa sobre o Adriático, ouviu no vento a musica do primeiro verso que desencadeou as "Elegias de Duino", Será ela a maior solidão?

Não, a maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão e a do ser
que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana. A maior solidão e a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo, e que não da a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro. O maior solitário e o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e de ferir-se, o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entretece também tudo em torno. Ele é a angustia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes da emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilegio, semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre."

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

MICHAEL BUBLE


PUT YOUR HEAD ON MY SHOULDER
Música para sonhar, música para dançar... . Simplesmente LINDO!

No link abaixo, um clique para ouvi-la no Youtube.

http://www.youtube.com/watch?v=Mx8aq7OsqT4&NR=1

STARDUST
Saudade em cada nota desta música...

É só clicar no link abaixo e a música vai preencher os espaços dessa saudade...

http://www.youtube.com/watch?v=A4jdINRprGk&NR=1

terça-feira, 18 de novembro de 2008

FLORBELA ESPANCA


AMOR QUE MORRE



O nosso amor morreu... quem o diria!

Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta,
Ceguinha de te ver, sem ver a conta

Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria...

E outro clarão, ao longe, já desponta!

Um engano que morre... e logo aponta
A luz doutra miragem fugidia...


Eu bem sei, meu Amor, que pra viver

São precisos amores, pra morrer

E são precisos sonhos pra partir.

Eu bem sei, meu Amor, que era preciso

Fazer do amor que parte o claro riso

Doutro amor impossível que há de vir!

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

NINHO ABANDONADO



Com o final do outono as árvores perdem completamente suas folhas, colocando a mostra o ninho abandonado pelos pássaros que partiram em migração, em busca de lugares mais quentes, em busca da própria sobrevivência.

(Dê um pequeno clique na imagem para aumentá-la)

PERTENCER...


Um lindo texo de Clarice Lispector



Um amigo meu, médico, assegurou-me que desde o berço a criança sente o ambiente, a criança quer: nela o ser humano, no berço mesmo, já começou.
Tenho certeza de que no berço a minha primeira vontade foi a de pertencer. Por motivos que aqui não importam, eu de algum modo devia estar sentindo que não pertencia a nada e a ninguém. Nasci de graça.
Se no berço experimentei esta fome humana, ela continua a me acompanhar pela vida afora, como se fosse um destino. A ponto de meu coração se contrair de inveja e desejo quando vejo uma freira: ela pertence a Deus.
Exatamente porque é tão forte em mim a fome de me dar a algo ou a alguém, é que me tornei bastante arisca: tenho medo de revelar de quanto preciso e de como sou pobre. Sou, sim. Muito pobre. Só tenho um corpo e uma alma. E preciso de mais do que isso.
Com o tempo, sobretudo os últimos anos, perdi o jeito de ser gente. Não sei mais como se é. E uma espécie toda nova de "solidão de não pertencer" começou a me invadir como heras num muro.
Se meu desejo mais antigo é o de pertencer, por que então nunca fiz parte de clubes ou de associações? Porque não é isso que eu chamo de pertencer. O que eu queria, e não posso, é por exemplo que tudo o que me viesse de bom de dentro de mim eu pudesse dar àquilo que eu pertenço. Mesmo minhas alegrias, como são solitárias às vezes. E uma alegria solitária pode se tornar patética. É como ficar com um presente todo embrulhado em papel enfeitado de presente nas mãos - e não ter a quem dizer: tome, é seu, abra-o! Não querendo me ver em situações patéticas e, por uma espécie de contenção, evitando o tom de tragédia, raramente embrulho com papel de presente os meus sentimentos.
Pertencer não vem apenas de ser fraca e precisar unir-se a algo ou a alguém mais forte. Muitas vezes a vontade intensa de pertencer vem em mim de minha própria força - eu quero pertencer para que minha força não seja inútil e fortifique uma pessoa ou uma coisa.
Quase consigo me visualizar no berço, quase consigo reproduzir em mim a vaga e no entanto premente sensação de precisar pertencer. Por motivos que nem minha mãe nem meu pai podiam controlar, eu nasci e fiquei apenas: nascida.
No entanto fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que meus pais me perdoaram por eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança.
Mas eu, eu não me perdôo. Quereria que simplesmente se tivesse feito um milagre: eu nascer e curar minha mãe. Então, sim: eu teria pertencido a meu pai e a minha mãe. Eu nem podia confiar a alguém essa espécie de solidão de não pertencer porque, como desertor, eu tinha o segredo da fuga que por vergonha não podia ser conhecido.
A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu perco não pertencendo. E então eu soube: pertencer é viver. Experimentei-o com a sede de quem está no deserto e bebe sôfrego os últimos goles de água de um cantil. E depois a sede volta e é no deserto mesmo que caminho!

QUAL SERIA O PESO DE UMA ALMA?

O pequeno texto abaixo parece conter a descrição de minha própria alma. Imagino que essa seja a missão dos poetas, dos escritores, dos pensadores: transcrever em palavras os sentimentos que nós pobres mortais também trazemos dentro de nós, mas não sabemos descrever... Aqui, coloco os sentimentos e as palavras de CLARICE LISPECTOR:

"Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros."

CECILIA MEIRELES



VALSA


"Fez tanto luar que eu pensei nos teus olhos antigos e nas tuas antigas palavras
O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos que tornei a viver contigo
enquanto o vento passava.

Houve uma noite que cintilou sobre o teu rosto

e modelou tua voz entre as algas
Eu moro, desde então, nas pedras frias que o céu protege

Coitado de quem pôs sua esperança
nas praias fora do mundo...
- Os ares fogem, viram-se as águas,
mesmo as pedras, com o tempo, mudam."

domingo, 16 de novembro de 2008

LEMBRANDO OUTROS DOMINGOS

Fico aqui, neste amanhecer cor de chumbo de domingo, nuvens escuras carregadas emoldurando as árvores já sem folhas que vislumbro aqui da minha janela, chuva grossa caindo sobre a cidade, uma certa e indecifrável tristeza oprimindo meu coração, não sei se saudades, não sei se apenas efeito do tempo, sem a menor perspectiva para o dia de hoje, buscando no meu baú de memórias alguns outros domingos que me couberam semelhantes a este e acabo me convencendo de que melhor seria buscar domingos mais alegres, domingos que me envolveram com a típica alegria que bailava entre as paredes do velho casarão, quando já quase saindo da adolescência a vida fazia de meus domingos dias de luz, ainda que plúmbeos como o de hoje. O despertar já com uma canção nos lábios, o preparar-me para ir a missa antes mesmo do café da manhã, porque a comunhão exigia jejum, e com que apuro eu me preparava para a missa! Vestido bem comportado, não se ia a igreja vestindo calças compridas, nem nos permitiam decotes ou blusas sem mangas. Sapatos sempre de saltos altos e meias, claro, aquelas meias com costuras, que eram perfeitamente alinhadas nas pernas, ainda presas por ligas, e o fio não podia estar torto; se levasse bolsa, deveria combinar com os sapatos. O missal, o terço... Brincos, anéis, colares, o que usasse deveria ser discreto, afinal igreja não era lugar de exibicionismos (rs), mas era a Casa de Deus e ninguém ia visitá-lo em Sua casa se não estivesse vestido adequadamente (como se Deus se preocupasse com isso!). Minha irmã já era casada por esse tempo, casou-se quase menina, um casamento desastroso que mereceria muitos capítulos a parte nas histórias que guardo nas minhas memórias, então íamos a missa minha prima Belinha e eu. Cumpríamos o ritual com muita contrição, muita fé e saíamos da igreja com a alma leve. A volta para casa era outro ritual, porque ao invés de tomarmos logo a Rua Piratininga, que começando em frente a igreja nos levava direto a rua Campos Salles, dávamos uma volta, íamos pela Rua Caetano Pinto. E tínhamos uma razão (deliciosa) para isso. Os churros que eram vendidos numa pequena casa dessa rua e que eram levados correndo para nossa mesa e devorados com o café-com-leite quentinho que já nos esperava prontinho. Diferentes dos que são vendidos hoje, eram salgados, sem recheio, fritos numa espiral, numa roda grande, realmente deliciosos, mas como toda fritura, tinham que ser comidos quentes, por isso a pressa em chegar em casa. Hummm... só de lembrar fico com uma fominha!... rs...
Depois do café minha mãe ia para a cozinha preparar o almoço que lhe tomava toda a manhã, porque almoço de domingo era sempre especial e o dia das moças era ocupado com doces amenidades, conversas entre amigas, ouvir música, ler, e depois do almoço havia a matinée num dos cinemas do bairro, ou um passeio num parque, ou ainda um joguinho de peteca ou tamborete ali mesmo, na rua, em frente a casa, o alegre bate-papo, sentadas na soleira da porta, e a noitinha, talvez, umas voltas pela Avenida, um passeio de mãos dadas com o namoradinho (isso se o tivesse...rs) e as nove da noite, todas recolhidas as suas casa, porque "moça de família" não ficava na rua depois dessa hora... rs... Ah! delicia de domingos... com gosto de churro feito com carinho por aquele casal de espanhóis, com aroma de saudades de um tempo que ainda mora dentro de mim...

Dulce/novembro de 2008

FERNANDO PESSOA - Não sei quantas almas tenho


Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

sábado, 15 de novembro de 2008

E POR FALAR EM AMIGOS......


Existe coisa melhor no mundo que falar de amigos? Claro que sim! Melhor que falar de amigos é falar com amigos. E quando estou aqui, “escrevinhando” nas madrugadas, estou, na verdade, falando com meus amigos. E para meus amigos abro meu coração, conto meus segredos, falo de minhas mágoas, desvendo meus mistérios, choro minhas dores mais secretas, exponho minhas alegrias mais profundas, me mostro por inteira, sem medo de parecer ridícula, piegas, tola demais, ou seja lá o que for, porque cada um deles me conhece, sabe de minhas verdades, conhece minhas fragilidades. E cada assunto que aborde imagino um amigo diferente a ouvir, pacientemente, concordando as vezes, balançando negativamente a cabeça mostrando que discorda, em outras, rindo das minhas gaiatices, chorando com minhas lágrimas, enfim, partilhando comigo a madrugada, dividindo comigo o enlevo ou o tédio, o prazer ou a angústia, exatamente como cabe a um bom amigo... Mas só porque é bom amigo precisa ficar acordado madrugada a dentro ouvindo minhas histórias? Ah, mas eu não fico só contando histórias, não!... Eu ouço musica – geralmente de muito boa qualidade e muito própria para o horário, leio a poesia dos meus poetas do coração, tenho sempre uma xícara de chá ao alcance da mão para oferecer a quem me acompanhe – tenho um amigo que só gosta de Coca-Cola e para ele tenho sempre algumas garrafas na geladeira... Se houver estrelas no céu, se na noite brilhar um luar de blue moon, podemos até nos sentarmos no terraço. E se estiver chovendo, certamente nos encantaremos com o reflexo das luzes da cidade e dos faróis dos carros sobre o asfalto molhado. Mas e se estiver fazendo frio? Aí acenderemos a lareira, puxaremos as poltronas mais para perto, deixaremos a sala apenas com a luz dos quebra-luzes... Um ambiente perfeito para um bate-papo na madrugada. Bom, se você concorda em me fazer companhia hoje, e como a noite está bem fria, venha sentar-se aqui nesta poltrona, “ao pé de mim”, como costumava dizer minha avó portuguesa. A musica é doce e preenche todos os cantos da sala... E a noite é uma criança...

Dulce/novembro de 2008

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

THIAGO DE MELLO


Sugestão

Antes que venham ventos e te levem
do peito o amor — este tão belo amor,
que deu grandeza e graça à tua vida —,
faze dele, agora, enquanto é tempo,
uma cidade eterna — e nela habita.

Uma cidade, sim. Edificada
nas nuvens, não — no chão por onde vais,
e alicerçada, fundo, nos teus dias,
de jeito assim que dentro dela caiba
o mundo inteiro: as árvores, as crianças,
o mar e o sol, a noite e os passarinhos,
e sobretudo caibas tu, inteiro:
o que te suja, o que te transfigura,
teus pecados mortais, tuas bravuras,
tudo afinal o que te faz viver
e mais o tudo que, vivendo, fazes.

Ventos do mundo sopram; quando sopram,
ai, vão varrendo, vão, vão carregando
e desfazendo tudo o que de humano
existe erguido e porventura grande,
mas frágil, mas finito como as dores,
porque ainda não ficando — qual bandeira
feita de sangue, sonho, barro e cântico —
no próprio coração da eternidade.
Pois de cântico e barro, sonho e sangue,
faze de teu amor uma cidade,
agora, enquanto é tempo.

Uma cidade
onde possas cantar quando o teu peito
parecer, a ti mesmo, ermo de cânticos;
onde posssas brincar sempre que as praças
que percorrias, dono de inocências,
já se mostrarem murchas, de gangorras
recobertas de musgo, ou quando as relvas
da vida, outrora suaves a teus pés,
brandas e verdes já não se vergarem
à brisa das manhãs.

Uma cidade
onde possas achar, rútila e doce,
a aurora que na treva dissipaste;
onde possas andar como uma criança
indiferente a rumos: os caminhos,
gêmeos todos ali, te levarão
a uma aventura só — macia, mansa —
e hás de ser sempre um homem caminhando
ao encontro da amada, a já bem-vinda
mas, porque amada, segue a cada instante
chegando — como noiva para as bodas.

Dono do amor, és servo. Pois é dele
que o teu destino flui, doce de mando:
A menos que este amor, conquanto grande,
seja incompleto. Falte-lhe talvez
um espaço, em teu chão, para cravar
os fundos alicerces da cidade.

Ai de um amor assim, vergado ao vínculo
de tão amargo fado: o de albatroz
nascido para inaugurar caminhos
no campo azul do céu e que, entretanto,
no momento de alçar-se para a viagem,
descobre, com terror, que não tem asas.

Ai de um pássaro assim, tão malfadado
a dissipar no campo exíguo e escuro
onde residem répteis: o que trouxe
no bico e na alma — para dar ao céu.

É tempo. Faze
tua cidade eterna, e nela habita:
antes que venham ventos, e te levem
do peito o amor — este tão belo amor
que dá grandeza e graça à tua vida.

Lágrimas na madrugada...



A casa está em silencio... A cidade está em silêncio... Minha alma está em silêncio... Um silêncio doído,, triste... Amuada ela se encolhe num canto lá dentro de mim, sem querer conversar. Caminho até a janela e tento mostrar a ela a noite sem estrelas, sem a lua que tanto a fascina, noite cheia de mistérios, de vidas escondidas por detrás de cada uma daquelas janelas iluminadas, tantas histórias, tantas almas iguais a ela, incompreendidas, insanas, achando que podem ainda romper barreiras, vencer preconceitos, partir amarras, sair em busca do sonho como se não tivessem a prende-las um corpo já cansado de tantos embates, de tantas desilusões. Mas ela continua em silêncio. Olha-me como se tivesse pena de mim, tão solitária quanto ela, como se me dissesse que eu me enganava quando pensava que poderia esconder dela o quanto sinto falta de uma presença, o quando anseio nas madrugadas por um ombro aonde possa repousar minha cabeça enquanto espero o sono chegar, uma mão que enlace a minha, uma voz que me embale docemente... Ela não diz nada, apenas me olha e,... ah, como ela me conhece!!! E eu a conheço tão pouco! O que a estará perturbando tanto hoje? Abro meu laptop e a musica chega suavemente até nós...”What a difference a day makes...” Olho mais profundamente para dentro de mim e consigo vê-la por inteiro. A música começa a envolve-la de tal maneira que ela inicia suaves movimentos de dança e estende os braços para mim num convite que aceito fascinada e lá vamos nós, duas solitárias, pela madrugada a dentro, no compasso dolente da musica, rodopiando pelo quarto, toda a tristeza da solidão no sorriso, todas as lágrimas de minha alma rolando pelo meu rosto...

( Dulce / novembro de 2008 )

No link abaixo, a música para dançar conosco... Dançamos?


http://www.youtube.com/watch?v=POfy0KodUpc

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

RAYUELA - Julio Cortazar

Lindo demais!...
Toco tu boca, con un dedo toco el borde de tu boca,
Voy dibujandola como si saliera de mi mano, como si
Por primera vez tu boca se entreabriera, y me basta
Cerrar los ojos para deshacerlo todo y recomenzar,
Hago nacer cada vez la boca que deseo, la boca que
Mi mano elige y te dibuja en la cara, una boca elegida
Entre todas, con soberana libertad elegida por mi para
Dibujarla con mi mano en tu cara y que por un azar que
No busco comprender coincide exactamente con tu boca
Que sonrie por debajo de la que mi mano te dibuja.

Me miras, de cerca me miras, cada vez mas de cerca y
Entonces jugamos al cíclope, nos miramos cada vez mas
De cerca y los ojos se agrandan, se acercan entre si, se
Superponen y los cíclopes se miran, respirando confundidos,
Las bocas se encuentran y luchan tibiamente, mordiendose
Con los labios, apoyando apenas la lengua en los dientes,
Jugando en sus recintos donde un aire pesado va y viene
Con su perfume viejo y un silencio. Entonces mis manos
Buscan hundirse en tu pelo, acariciar lentamente la profundidad
De tu pelo mientras nos besamos como si tuvieramos la boca
Llena de flores o de peces, de movimientos vivos , de fragancia
Obscura. Y si nos mordemos el dolor es dulce, y si nos ahogamos
En un breve y terrible absorber simultaneo del aliento, esa
Instantanea muerte es bella. Y hay una sola saliva y un solo
Sabor a fruta madura, y yo te siento temblar contra mi como
Una luna en el agua.

Fernando Pessoa e seu "Poema em linha reta"



Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda,
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de frete,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco,
Eu que tenho que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe – todos eles príncipes – na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideus!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traído – mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A verdade diante do espelho...


A noite já ia alta, quase madrugada e ela continuava ali sentada, a manta sobre os joelhos, a xícara de chá sobre a mesinha ao lado já quase vazia, a musica suave espalhando-se pela sala em penumbra, o crepitar do fogo que ia se extinguindo na lareira, o livro abandonado sobre o colo, mãos entrelaçadas, o pensamento longe, muito longe, do outro lado do mar, tão distante no espaço como no tempo... Fazia tanto tempo1... Tanto!... Dez anos? Onze, talvez? Pelo menos uns cinco ou seis anos sem a menor notícia... E no entanto tudo estava tão presente em sua memória. Havia uma imagem, uma voz, uma presença bailando dentro dela, deixando inquieta a alma, um tanto descompassado o coração. Esperara tanto por um encontro, fizera tantos planos, tivera tantos sonhos, ansiara tanto por esse momento, tudo em vão. A vida, o acaso, o destino, tudo tinha conspirado contra a realização desse sonho, e o tempo foi passando, suas vidas foram tomando outros rumos e quando se deu conta já nem sabia mais por onde andava esse sonho... E era tão lindo...
E agora que já se sentia em paz, agora que suas noites eram de serenidade, agora que tinha entendido que seu caminhar deveria ser feito em passos solitários, agora que guardava em si, como um pequeno tesouro, apenas uma doce e amiga saudade, justamente agora, aquele e-mail... A princípio ela achou que se enganara, quando o coração deu um salto no momento mesmo em que seus olhos leram o nome de quem o enviara. Não podia ser! Fazia anos que aquele remetente não chegava a sua caixa postal. O que estaria fazendo ali? Devia ser engano, nomes semelhantes, qualquer coisa assim, mas não... não havia engano. As mesmas palavras iniciais, a mesma forma carinhosa de falar, os mesmos sentimentos expressos ali na tela do computador. - Tentara esquecer, sabia impossível o relacionamento, mas não conseguira. Nos últimos anos a vida transcorrera bem, tinha recursos agora, pretendia vir ao Brasil... - A cada frase o coração parecia querer saltar-lhe pela boca. Mas que emoção era aquela? Então já não o tinha esquecido? Aquiete-se alma, sossegue... Leu e releu aquele e-mail muitas vezes como para se convencer de que era verdade, mas deixou para responder depois, quando estivesse mais calma, só que o dia passou e a calma não veio. E a noite foi passando e chegando a madrugada. Ah madrugada! Amiga, sempre boa conselheira. Ergueu-se da poltrona para ir a cozinha preparar um outro chá e ao passar pelo aparador deparou-se com a própria imagem no espelho e parou, assustada. Olhou mais detidamente a imagem que mal reconhecia, examinou cada ruga, cada marca do tempo em seu rosto, seu olhar foi descendo e constatando os estragos que a passagem dos anos fizera em seu corpo, em sua pele,,, Não tinha se dado conta do quanto tinha envelhecido nos últimos anos, com todos aqueles acontecimentos na família... O processo de envelhecimento se faz no dia a dia e vamos nos acostumando com as mudanças, muitas vezes nem as percebemos e, de repente, diante de um espelho, nós nos deparamos com uma pessoa que não se parece, em nada com a imagem que fazemos de nós mesmos... É um choque! Foi um choque para ela que já começara a imaginar os termos para a resposta daquele e-mail... Resposta? Ah, não!... não haveria resposta. Ele imaginaria que o endereço dela havia mudado, não teria como encontra-la, e guardaria dela a imagem da mulher madura, bonita, inteira. Guardaria a lembrança doce, o carinho... Não permitiria a ele a decepção, o desencanto. Não o colocaria diante de uma mulher sofrida, sem encantos, marcada. Não suportaria ver refletida nos olhos dele toda aquela devastação que via agora diante do espelho. Há um tempo para tudo e o tempo para aquele encontro tinha passado...
Esqueceu-se do chá, foi ao computador, abriu a caixa de correio e deletou o e-mail que ansiosamente esperara por mais de seis anos, enquanto sentia nos lábios o sal das lágrimas que banhavam seu rosto...

Dulce Costa/novembro de 2008

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Vamos ouvir Toquinho?


E o que há de melhor, num dia muito frio, coração cheio de saudades da terra e da gente que lá ficou, do que Toquinho, seu violão (demais) e sua arte? É só dar uma clicadinha no link abaixo e curtir comigo, me ajudando a matar saudades...

http://www.youtube.com/watch?v=pJxMYy5kMrs

Shakespeare - Frases soltas


"Conservar algo que possa recordar-te seria admitir que eu pudesse esquecer-te."

"Nossa vida é tecida pelos mesmos fios dos nossos sonhos, Aprende a construir todas as tuas estradas de hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão."

"O tempo é muito lento para os que esperam, muito rápido para os que têm medo, muito longo para os que lamentam, muito curto para os que festejam.
Mas para os que amam, o tempo é eternidade."

"A realidade é que não te amo com meus olhos que descobrem em ti mil falhas. Mas com o meu coração que ama o que eles desprezam e, apesar do que vê, adora se apaixonar."

"Se teus sonhos estão nas nuvens, não te preocupes, eles estão no lugar certo; agora construa os alicerces.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Uma lua para um amigo...



Cinco da tarde deste final de outono em Winchester. Temperaturas já bem baixas, beirando zero graus e, depois de quase uma semana de chuvas, hoje o sol brilhou sobre a cidade, mas os dias agora são curtos e já se faz noite... E que noite!... Vejam só a lua (foto acima) que se esparrama toda pela cidade, fazendo sonhar, despertando sentimentos...
Tenho um amigo que perdeu sua lua, a que o visitava em sua varanda e o encantava fazendo pose para suas fotos. Era uma lua amiga, confidente, namorada. Mas um novo prédio nasceu ao lado do seu e escondeu Dona Lua, que não pode mais ser alcançada nas madrugadas insones pelos clicques de sua máquina. Ficou a saudade, ficaram fotos lindas... Por isso resolvi fotografar a lua sobre Winchester, como um presente virtual, uma lua para meu amigo... Com afeto.

Chico Buarque e a solidão


Solidão não é a falta de gente para conversar, namorar, passear ou fazer sexo...
Isto é carência.
Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar...
Isto é saudade.
Solidão não é o retiro involuntário que a gente se impõe, as vezes, para realinhar os pensamentos,,,
Isto é equilíbrio.
Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente para que revejamos a nossa vida...
Isto é um princípio da natureza.
Solidão não é um vazio de gente ao nosso lado...
Isto é circunstância.
Solidão é muito mais do que isto. Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma.

(Francisco Buarque de Holanda)

domingo, 9 de novembro de 2008

HOJE - Taiguara




Uma letra linda demais... E você pode ouvir Taiguara clicando no link mais abaixo

HOJE

Trago em meu corpo as marcas do meu tempo
Meu desespero a vida num momento
A fossa, a fome, a flor, o fim do mundo
Hoje
Trago no olhar imagens distorcidas
Pois viagens, mãos desconhecidas
Trazem a lua, a rua às minhas mãos
Mas hoje,
As minhas mãos enfraquecidas e vazias
Procuram nuas pelas luas, pelas ruas
Na solidão das noites frias por você
Hoje
Homens sem medo aportam no futuro
Eu tenho medo acordo e te procuro
Meu quarto escuro é inerte como a morte
Hoje
Homens de aço esperam da ciência
Eu desespero e abraço a tua ausência
Que é o que me resta, vivo em minha sorte
Ah, sorte
Eu não queria a juventude assim perdida
Eu não queria andar morrendo pela vida
Eu não queria amar assim
Como eu te amei

http://www.youtube.com/watch?v=4-JSArsBkck