Um Poeta consegue transformar até um prosaico banho de bacia num poema encantador...
Está aí nosso Mestre Drummond para confirmar o que digo.
BANHO DE BACIA
No meio do quarto a piscina móvel
tem o tamanho do corpo sentado.
Água tá pelando? mas quem ouve o grito
deste menino condenado ao banho?
Grite a vontade.
Se não toma banho não vai passear.
E quem toma banho em calda de inferno?
Mentira dele, água tá morninha,
só meia chaleira, o resto é da bica.
Arrisco um pé, outro pé depois.
Vapor vaporeja no quarto fechado
ou no meu protesto.
A água se abre à faca do corpo
e pula, se entorna em ondas domésticas.
Em posição de Buda me ensaboo,
resignado me contemplo.
O mundo é estreito. Uma prisão de água
envolve o ser, uma prisão redonda.
Então me faço prisioneiro livre.
Livre de estar preso. Que ninguém me solte
deste círculo de água, na distância
de tudo mais. O quarto. O banho. O só.
O morno. O ensaboado. O toda vida.
Podem reclamar,
podem arrombar
a porta. Não me entrego
ao dia e seu dever.
(Carlos Drummond de Andrade)
12 comentários:
Drummond no seu melhor, Dulce.
Dulce:
O eu lírico cria liberdade no espaço circular de sua prisão. Dá espaço para reflexões do tamanho da vida, não é?
Bjos
Patti
E é ai que se faz a diferença, Patti.
Maria Teresa
Não fosse essa uma das mais marcantes características de Drummond...
Beijos
Exatamente como todas as crianças. Ah Drummond!
E Michael Buble canta, mas ainda prefiro o original:
"Que reste-t-il de nos amours
Que reste-t-il de ces beaux jours"
beijos Dulce e Sol de Outono para ti.
Pitanga Doce
Pois é!... É Drummond.
Ah, Mila, essa música é linda em qualquer idioma.
Beijos e paz de céu azul para você.
Com bacia ou sem bacia...a birra de todas as crianças quando chega a hora do banho...aqui poeticamente descrita como só Drummond o sabe fazer...Não é lindo?
Beijoa
Graça
Graça Pereira
É lindo sim, Graça. É simplesmente Drummond, em sua sensibilidade, em sua vivência, em sua poesia.
Beijos
Dulce, levei uma antiga música sua viu? Entre o Céu e o Mar. Cai como uma luva, amiga!
beijos e o sol brilha lá fora.
Pitanga Doce
Essa música é linda demais, Mila.
E quando cai como uma luva, então, fica mais linda ainda.
Beijos
Só mesmo Drummond para me fazer viajar pela memória...
Um dia, já lá vão uns anos, decidir cometer uma boa acção - dar banho a uma neta que os pais, naquele fim-de-semana, deixaram à guarda dos avós.
Tudo preparado. Banheira cheia de água quentinha, bonequinhos boiando... enfim um lago parecendo piscina de paraíso.
Quando pus a menina na água, ó senhores, desatou numa berraria que, por certo atravessou a rua e foi bater em frente na casa do vizinho. Quanto mais a tentava acalmar, mais ela chorava aos gritos. Não satisfeita ainda bateu pernas e mãos, chapinhando, fazendo ondular a água que transbordou e me molhou!
Desisti, chamei a avó e passei-lhe a encomenda. Banho em neta nunca mais!
Beijos
Carlos Albuquerque
Que história meu amigo!... rs... Mas criança é mesmo assim, foge do banho, faz uma algazarra só. Depois, tirá-las da banheira é outro problema.
E Drummond nos remete sempre a doces lembranças.
Beijos
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