Este é um poema que me comove. Tenho ainda comigo, atadas por um laço azul, de cetim, amareladas pelo tempo, as cartas que trocamos, meu marido e eu, quando noivos, lá nos anos dourados e fico imaginando como se sentiriam meus netos se um dia as descobrissem e quisessem le-las.
Talvez não o fizessem com o mesmo encanto, já que, certamente, não encontrariam a poética de Bandeira (será que ela existia em seus avós?); talvez as achassem recatadas, ou piegas. Talvez, como o Poeta, fizessem comparações, não sei... Não consigo imaginar qualquer dos meus netos, cabelos grisalhos, rosto marcado pelo tempo, abrindo minha caixinha de porcelana antiga, desatando o laço azul, manuseando envelopes, desdobrando amareladas folhas de fino papel e mergulhando no tempo atrás de uma simples história de amor.
Claro que não tão simples, porque foi por ela que se preparou sua existência, mas igual a tantas outras embora única... Que sensação teriam ao ler as cartas de seus avós?
Talvez não o fizessem com o mesmo encanto, já que, certamente, não encontrariam a poética de Bandeira (será que ela existia em seus avós?); talvez as achassem recatadas, ou piegas. Talvez, como o Poeta, fizessem comparações, não sei... Não consigo imaginar qualquer dos meus netos, cabelos grisalhos, rosto marcado pelo tempo, abrindo minha caixinha de porcelana antiga, desatando o laço azul, manuseando envelopes, desdobrando amareladas folhas de fino papel e mergulhando no tempo atrás de uma simples história de amor.
Claro que não tão simples, porque foi por ela que se preparou sua existência, mas igual a tantas outras embora única... Que sensação teriam ao ler as cartas de seus avós?
Cartas de meu avô
A tarde cai, por demais
Erma, úmida e silente...
A chuva, em gotas glaciais,
chora monotonamente.
E enquanto anoitece, vou
Lendo, sossegado e só,
As cartas que meu avô
Escrevia a minha avó.
Enternecido sorrio
Do fervor desses carinhos:
É que os conheci velhinhos,
Quando o fogo era já frio.
Cartas de antes do noivado...
Cartas de amor que começa,
Inquieto, maravilhado,
E sem saber o que peça.
Temendo a cada momento
Ofendê-la, desgostá-la,
Quer ler em seu pensamento
E balbucia, não fala...
A mão pálida tremia
Contando o seu grande bem.
Mas, como o dele, batia
Dela o coração também.
A paixão, medrosa dantes,
Cresceu, dominou-o todo.
E as confissões hesitantes
Mudaram logo de modo.
Depois o espinho do ciúme...
A dor... a visão da morte...
Mas, calmado o vento, o lume
Brilhou, mais puro e mais forte.
E eu bendigo, envergonhado,
Esse amor, avô do meu...
Do meu - fruto sem cuidado
Que ainda verde apodreceu.
O meu semblante está enxuto.
Mas a alma, em gotas mansas,
Chora abismada no luto
Das minhas desesperanças...
E a noite vem, por demais
Erma, úmida e silente...
A chuva em pingos glaciais,
Cai melancolicamente.
E enquanto anoitece, vou
Lendo, sossegado e só,
As cartas que meu avô
Escrevia a minha avó.
(Manuel Bamdeira)
12 comentários:
Querida Amiga,que ternura e beleza de post.
Li uma ou outra que achei um encanto.
Apenas senti que a Vovó ficou um tanto constrangida.Mas era uma ternura respeitosa,digamos...
Um querer dizer mais e recear. Amei!!
Beijo.
isa.
São lindas as cartas de outrora e o laço de fita azul, parece que é uma constante. Não sei o que eles (netos) pensariam de cartas sem a poesia de Bandeira, mas que eram lindas, ah isso eram! Mas sabes, Dulce, nem parecem que foram escritas por nós? Ou tu não sentes como eu?
beijos em tarde de chuva e espera...
Isa
Constrangida? Pode ser... Mas as cartas eram singelas, até um tanto contidas, como cabem ser aos avós... rs...
Obrigada, querida amiga.
Beijos e linda tarde para você.
Pitanga Doce
Havia ternura, encanto,coisas que ainda existem em cada amor, mas a forma de expressar era outra, mais contida, sei lá.
Ah, mas há tanta coisa que eu escrevo ainda e depois fico achando que não fui eu... risos...
Beijos e uma boa tarde, Mila.
Isa, realmente Manuel Bandeira não deixou pra ninguém. Isso é ser poeta!! Obrigada pelo poema. Bjssss
Mzrli Borges
É Bandeira, e nem precisa dizer mais nada, não é?
bjs
Tão doce, tão lindo, tão melodioso, tão tudo de bom amiga!!!!
Beijinhos,
Ana Martins
Olá Dulce
Realmente ao lermos o que escreveram no passado nossos avós ou mesmo o que nós escrevemos a 30,40 anos atrás, sentimos como o tempo mudou o sentimento. Já não se sente como se sentia...não se ama como se amava. Diferente é a forma de encarar o amor. Antigamente morria-se por amor. Hoje mata-se por falta de amos.
Bjs
Bernardo
Ana Martins
Obrigada, querida amiga.
Beijos e uma boa noite para você/
Bernardo
O que vem comprovar que nem todas as mudanças são para melhor. Penso que o mundo anda carente daquele jeito de ser, de amar, lá dos "antigamentes"...
Beijo, obrigada e linda noite para você.
É minha primeira vez por cá! Achei muito bonito tudo isto! Muita emozao me fiz sentir! Descolpa meu portugués porque nao falo bem e sou uruguaia.
Foi um prazer ler-te!
Beijinhos
Luadosul
Esta é a primeira vez que recebo a visita de uma uruguaia aqui em meu cantinho, e estou muito feliz com isso. Muito obrigada por ter vindo, você é muito bem vinda. E seu português é muito bom.
O prazer foi meu, Luadosul e espero ve-la mais vezes.
beijos
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