floquinhos

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

UM FRIO QUE NAO VEM DA NEVE...


Voltou a nevar nesta madrugada. Pouco, mas o suficiente para aquela sensação de frio maior ir se instalando em tudo. Nos telhados semi-cobertos pelo branco que semi-cobre os gramados que ainda guardavam sobre eles uma camada de gelo em que, pela ação da chuva, havia se transformado a ultima neve, os galhos ressequidos das árvores, tudo de novo com uma camadinha branca, tudo cinzento, frio... Os últimos dias tinham sido até amenos, mas hoje... ai, ai... haja lãs para cobrir o corpo, de novo...
E minha alma, nesta manhã de penúltimo dia do ano, acompanha o tempo e está sentindo também um friozinho cortante, Aquela inexplicável mas compreensível tristeza que ronda alguns dos meus dias e que me traz lembranças, umas doces, outras nem tanto, aquela sensação de abandono, de nunca mais... E fico aqui divagando, rememorando, indo e voltando no tempo, analisando momentos e atitudes de pessoas que talvez nem carecessem dessas análises, tentando recompor minha serenidade perdida mercê alguns pequenos enganos. Tenho travado uma luta comigo mesma, tentando mudar meus passos, alterar pelo menos um pouquinho minha forma de caminhar, mas devo confessar que não tem sido fácil. Fui, sou e acho que sempre serei inveterada sonhadora, incorrigível romântica, e isso trouxe sempre muito encanto aos meus dias, sempre me fez melhor, mas anda me incomodando um pouco ultimamente, já não me sinto tão a vontade com essas turbulências d’alma, principalmente com as decepções, com as mágoas, com a sensação de ter sido tola que isso acaba sempre me acarretando quando a realidade cai sobre mim. Porque a realidade nem sempre é delicada para com quem vive, ainda que por apenas um curtíssimo período, no mundo da lua... Ao se voltar a ela o que se encontra é um vazio ainda maior do que aquele ao qual já estávamos habituados e que já quase nem nos incomodava mais, o que nos aguarda são dias sem graça, sem cor, aonde a musica que nos encantava nos faz chorar, aonde a lua que nos enfeitiçava só nos põe tristes, e ainda por cima vamos acabar por perceber que os lugares, os cantos da casa que eram pura magia, um terraço, uma poltrona que foi mágica, uma lareira, enfim, os pequenos e doces lugares de nosso aconchego, foram transformados em lugares aonde já não nos sentimos em paz, em espaços que já não nos acolhem...
Mas não fica arrependimento algum pelo sonho, pela ilusão do momento, pela credulidade tola, porque a alma viveu momentos, o coração descobriu-se ainda pronto para abrigar sentimentos doces, os dias foram de luz, as noites de muito luar, a vida foi encanto, naquilo que nem foi vivido, mas apenas pensado... Assim como o disse Fernando Pessoa em seu “Tenho tanto sentimento”,,,

Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

(Fernando Pessoa)

Dulce Costa
Winchester, 30 de dezembro de 2008

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