floquinhos

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

UBIRAJARA E SUAS MOEDAS DE ANO NOVO


No Reveillon do Ano 2000, Ubirajara entregando suas moedas do Ano Novo aos filhos...

Ultima madrugada do ano. E eu aqui, de novo, insone, cheia de saudades, triste, precisando conversar com você... Vamos falar sobre o dia de hoje, sobre o último dia do ano?
Este sempre foi um dia especial para você. Acho que, sem contarmos o dia de seu aniversário, era o que você considerava mais importante e sempre ficava em alegre expectativa quando o final do ano se aproximava. Gostava tanto do Reveillon! E nem era por causa dos fogos, não... Era mesmo pela mudança de calendário, pelo que isso significava para seus sonhos e suas esperanças, sempre almejando um ano melhor do que o que terminava. E nossos Reveillons sempre foram em família, tradição que eu levei para nossa casa quando nos casamos e que você adotou de coração, lembra? E a essa nossa tradição você incorporou uma outra, trazida lá das Minas Gerais, e que era um costume de seu pai. Ele costumava distribuir moedas as pessoas amigas, na passagem de ano, para que nunca faltasse dinheiro no bolso ou na bolsa de quem as recebesse, na crença de que o que acontece no primeiro dia do ano vai se repetindo pelos outros 364 dias afora.... E você, religiosamente, juntava moedinhas durante a semana e na noite de Ano Novo, depois do champanhe, dos abraços, dos fogos, colocava a mão no bolso e de lá retirava um punhado de moedas e ia entregando uma a uma a cada um de nós, como moedas de boa sorte e desejando que nunca nos faltasse dinheiro para as necessidades cotidianas... Era um momento seu, e todos nós nos incorporávamos a ele com muito prazer, com muita alegria. Você era um homem de tradições... Tradição que nossos filhos continuam, em seu nome, a cada Reveillon. E que me emociona profundamente.
Lembra-se do quanto você desejava chegar ao ano 2000? Era como se você esperasse algum encanto especial, algum acontecimento, sei lá,. A medida em que o milênio se aproximava de seu final você foi ficando mais e mais animado, na expectativa de chegar ao ano 2000! Sempre fora um sonho para você, E tememos muito que isso não acontecesse quando na metade do ano de 1999 você foi acometido por um infarto. Mas você sempre foi um lutador e ali, cuidado por nosso filho, numa batalha feroz que ambos travaram contra a indesejada, vocês conseguiram uma trégua, um tempo maior para alegria nossa. Sabíamos que esse tempo poderia ser pequeno, mas era precioso, e seu amor pela vida venceu o tempo. Assim, naquele Reveillon para o Ano 2000 lá estávamos todos nós juntos, festejando o tempo e a vida. E lá estava você distribuindo suas moedinhas e sua alegria para todos nós.
Já no último Reveillon em que estivemos juntos, meu coração sangrando ao vê-lo ali em seu sono eterno, foi a sua vez de ganhar moedas. Só que não eram moedas da sorte, você já não precisava delas, mas foram as moedas que você pediu a nossa filha que colocasse em suas mãos para a travessia final. Vi, na madrugada do primeiro dia de 2003 nossa menina, com os olhos cheios de lágrimas, colocar duas moedas entre suas mãos inertes e sussurrar docemente: “Ai estão as moedas para o Caronte, pai, para que sua travessia seja cumprida. Vá em paz.” Ela cumpria assim um acordo que fizera com você dias antes e guardara em segredo até o momento final. Você lhe pedira que quando chegasse a hora de sua partida, que ela colocasse em suas mãos o óbolo para pagar o barqueiro, e ela atendia assim ao seu pedido... E mais uma tradição histórica fora cumprida...

Com amor, com saudades,

Dulce Costa
Winchester, madrugada o último dia de 2008.

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