floquinhos

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Por aqui (ainda) alguns ecos do Natal...



Joaninha costumava correr solta pelas ruas em brincadeiras com suas amiguinhas, pulando corda e amarelinha, brincando de roda, de boneca, desenhando sobre a calçada, com pedaços de carvão que pegava na cesta ao lado do fogão, aproveitando a doce liberdade que era privilégio daqueles tempos.
Era uma rua antiga, habitada por imigrantes europeus. Eram os primeiros anos da década dourada do século passado...  Era um mundo que, visto através do prisma do tempo, era pura magia...
Era manhã de Natal e, como em todas as manhãs de Natal, as crianças reuniam-se nas portas das casas para exibir o presente que Papai Noel havia deixado para cada uma delas. Havia uma quase igualdade naqueles presentes, posto que havia uma quase igualdade em cada um daqueles lares habitados por famílias menos favorecidas. Mas, naquele ano foi diferente.
Dois ou três meses antes, mudara-se para um dos casarões uma pequena família que, diferente das outras, tinha uma melhor posição social. Um casal e uma única filha, uma menina que parecia frágil e doentia, que com seus lindos vestidos e seus sapatos graciosos, destoava claramente das outras meninas.
Naquela manhã, as meninas, num alarido, exibiam suas bonecas, simples, feitas de pano (algumas por suas próprias avós) que Papai Noel havia deixado em seus sapatinhos, quando Maria Lúcia, pelas mãos de sua mãe, passou por elas carregando nos braços a mais linda visão que já havia povoado seus pequenos mundos... Uma boneca de porcelana! Linda, ricamente vestida, longos cabelos arrematados por um delicado chapéu, nos pés graciosos sapatinhos dourados. Fez-se silencio a sua passagem.
Bocas entreabertas de espanto, olhinhos esbugalhados de admiração, não conseguiam dizer palavras.
Ao perceber o impacto que causara entre suas pequenas vizinhas, a petulante garota semicerrou os olhos, levantou o queixo num gesto de enfado e, virando-se para a mãe, disse: “Veja, mamãe, as pobretonas estão com inveja da minha bonequinha...” A um “não liga...”, da mãe, ambas apressaram o passo e foram sumindo no final da rua.
Mal refazendo-se do espanto, Joaninha saiu correndo em direção a sua casa onde encontrou a mãe preparando o almoço de Natal. Segurando-a pelo avental, como a exigir atenção, foi logo contando o que se passara lá na rua e dizendo que Papai Noel não era justo, porque dava aquela menina que já tinha tudo, seu mais lindo presente e a elas, que nada tinham, ofertava simples bonequinhas de pano.
A mãe envolvendo-a num abraço, tentando segurar as lágrimas que insistiam em marejar-lhe o olhar, buscando palavras para explicar o inexplicável, mal conseguiu murmurar: “A minha filha, o mundo é um caminho de injustiças.

Quase cinquenta anos depois, cumprindo um ritual sagrado para seu Natal, Joaninha chegava aquele orfanato, com as amigas, carregando tantos e tão lindos brinquedos para que os pequenos órfãos, já nascidos injustiçados, tivessem, pelo menos, um Papai Noel mais justo...

3 comentários:

UBIRAJARA COSTA JR disse...

Mari Amorim

Obrigada, Mari. Desejo o mesmo para você.
beijos e uma boa noite.

Paloma disse...

DULCE, ao longo da vida, há certas
situações muito dificeis de expli-
car e justificar, para uma criança.
Existem muitas desigualdades, infe-
lizmente.

Beijos,com carinho

UBIRAJARA COSTA JR disse...

Paloma

É verdade. É preciso muito tato para abordar certos assuntos, sem deixar traumas.
Beijos e uma boa noite para você.