sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Sempre pode haver um recomeço


Chovia torrencialmente quando Marta, cumprido seu horário de trabalho, entrou em seu carro , no estacionamento do banco, ainda sem saber se tomaria o caminho de casa ou se daria uma passadinha no shopping para comprar o livro que estava querendo ler. Poderia aproveitar para fazer um lanche e assim não teria que se preocupar em ir para a cozinha naquela noite. Estava cansada, física e mentalmente, as últimas duas semana tinham sido difíceis e ela só queria aproveitar o final de semana para por suas idéias e sua vida em ordem.
Nunca imaginou que fosse tão difícil recomeçar, que o fim de um casamento há muito falido pudesse deixa-la tão abatida, tão sem expectativas... Afinal, foram dez anos de vida em comum que, por sinal, de em comum já não tinha nada há muito tempo.
Jorge e ela haviam sido apaixonadíssimos um pelo outro e estruturaram um viver de total dependência mutua, viver que se prolongou por seis ou sete anos, até que aconteceu aquela viagem de Jorge a Londres, onde ficaria trabalhando por dois meses, tempo que para ela pareceu tão longo ... Percebeu a mudança logo na chegada do marido no aeroporto. Não houve aquele beijo caloroso, cheio de saudade com que ela costumava ser presenteada a cada vez que ele voltava de uma de suas viagens de trabalho e, no dia a dia, ele foi se afastando cada vez mais, foi ficando indiferente, meio frio, distante. Quando ela questionava tal mudança ele dava como desculpa o cansaço pelo excesso de trabalho. E assim os anos foram se passando e cada um foi ficando para o seu lado até que, finalmente, Jorge tomara a decisão pelos dois. Aceitara uma transferência para Londres aonde passaria a viver, e quando ela perguntou quando iriam, ele sentou-se a seu lado no sofá da sala, tomou-lhe as mãos e, olhando-a friamente nos olhos, disse-lhe que o casamento estava acabado, que eles não tinham mais nada em comum, e que ele estava vivendo um novo amor. Conhecera-a em sua primeira viagem a Londres e, desde então vinham mantendo um relacionamento a distancia, encontrando-se a cada viagem que ele fizesse a Europa, pois sempre tirava uns dias para estar com ela em Londres.
Já havia resolvido tudo, a separação seria amigável e ela poderia ficar com todos os bens do casal, ele não queria nada alem da liberdade para recomeçar sua vida.
Marta sentiu o mundo desabar sob seus pés, mas tentando manter-se serena diante daquele homem que fora a razão de sua vida por tantos anos, tentando segurar as lágrimas que teimavam em rolar por seu rosto, apenas assentiu com a cabeça perguntando quando ele partiria... mas nem conseguiu ouvir a resposta. Correu a trancar-se no quarto onde chorou toda a sua dor.
Ele partira havia uma semana e agora ela teria que encontrar novos caminhos para sua vida. A chuva batia forte contra os vidros do carro, os pneus iam deixando um caminho no asfalto logo coberto pela força da água; Marta sabia que o recomeço seria difícil, mas havia uma vida pela frente, uma vida que ela começava a enfrentar. Enxugou os olhos, estacionou o carro na vaga encontrada, respirou fundo e partiu em busca de seu destino.

Dulce Costa
Campinas, 19 de fevereiro de 2010

12 comentários:

  1. Gostei desta história. Há sempre uma Primavera à nossa espera... e a andorinha poderá encontrar outro beiral onde fazer o seu ninho...Nos caminhos desencontrados, ás vezes, tropeçasse com a felicidade!
    Beijo amigo e bom fds
    Graça

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  2. Dulce,

    saudades!

    primeiro, parabéns pelo lindo conto, que estou aqui, lendo e relendo, sem me cansar... vc escreve muito gostoso e muito bem e sabe disto!!!

    Quero que transmita um pequeno recado meu à sua linda personagem Marta: diga-lhe que o mundo está à sua espera, e que um novo amor a espera na próxima esquina, ou no próximo café, ou em algum outro lugar qualquer a que for...

    Sorte, ela já teve, de se livrar de quem não a amava!rs

    Lindo, amei.

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  3. Belíssima história, Dulce. Tenho de reconecer que ela reflecte a cobardia de muitos homens e a força de muitas mulheres. Esta história, infelizmente, não é a excepção, mas sim a regra. Normalmente, os homns portam-se muito mal nas situações de divórcio.

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  4. Graça Pereira

    É verdade, minha amiga, embora dificil, um recomeço sempre se dará e a vida refeita certamente ira presentea-la com novos caminhos.
    São tantas as "Martas" espalhadas por este mundo de Deus...
    Beijos, obrigada e boa noite

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  5. Graça

    Obrigada, querida amiga, que bom que gostou.
    Mas tenho certeza que sim. E quando tudo tiver passado ela vai olhar para trás e perceber que a vida está muito melhor, que ela se sente mais senhora de si, que pode finalmente moldar sua propria vida, escolher seus caminhos.
    Vejo isso em minha filha, recem-saida de um doloroso divorcio e que é hoje uma mulher feliz.
    Beijos e obrigada

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  6. Carlos

    Pois, é, meu amigo, infelizmente reflete sim. História até semelhante foi vivida por minha filha, recem-saida de um doloroso divórcio. Muito sofrimento porque inesperado, no entanto, ela é hoje uma mulher em paz com a vida e consigo mesma, desenvolvendo muito mais sua carreira, criando seus filhos com dignidade e amor, muito mais confiante, segura e serena.
    Foi um momento ruim, muito ruim, mesmo, mas hoje ela está linda, feliz... Ele? Nem tanto...

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  7. História sensível e comovente, Dulce.
    A separação de casais, o divórcio choca-me. Aconteceu com meus pais, estava eu no início da adolescência. Marcou-me.
    Jurei, então, a mim próprio, que se um dia o amor me batesse à porta seria sentimento para toda a vida, fazendo dele uma partilha a dois, de fidelidade e respeito mútuo. Assim tem sido, e bem,já lá vão mais de quatro décadas sobre o meu casamento.
    Beijos

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  8. Carlos

    Também sempre preservamos, meu marido e eu, nosso casamento que se estendeu por quarenta e quatro anos e só terminou com a morte dele. Hoje as uniões são bem menos duráveis...
    Beijo, obrigada e bom final de semana

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  9. Minha querida Dulce,eu já fui "Marta"
    eram os meus filhos bem pequenos:6 e 9 anos.
    Como foi? Difícil,como sempre.Ñ houve lealdade! Descobri...
    E depois? Ele saiu!
    Depois esta Marta olhou o espelho,os
    Filhos amados,as aulas e os seus queridos Alunos.Pediu a Deus Saúde,
    Força,para educar quem ñ pedira para nascer!
    Deus ouviu! Ñ lhe prometeu facilidade,
    ñ lhe prometeu rapidez!
    Mas Disse-lhe q.ela ia vencer!
    10 anos passados,doente,uma mão à frente e outra atrás,com um filho,
    ele pediu para voltar.
    Com pena,mas sem Amor aceitou.
    Foi horrível! Ele morreu em casa,doente e tratado pela "Marta".
    Hoje essa Marta está só pq. assim quer,mas AMA a VIDA!Fresca!Avó!
    Criou 2 Filhos de quem se orgulha!
    Trabalhou duramente e...embora tenha "Dias e dias", ri,sorri e tb.
    chora.
    Perdoou? Sim. Mas ñ esqueceu.
    Como podia,né?
    Beijoo.
    isa.

    PS:- Para que as Martas nunca percam a ESPERANÇA!

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  10. Dulce:
    Ainda bem que o sol desponta todo dia, não é? Nós, seres humanos, somos grandes felizardos!
    Beijos.

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  11. Isa
    São tantas as Marias, não , minha amiga? Imagino como deve ter sido dificil para você, mas admiro sua grandeza de sentimentos demonstrada pelo perdão e mais ainda pelos cuidados dispensados a quem tanto a faz sofrer.
    E sua recompensa veio no amor de seus filhos e na chegada de seus netos.
    Que lição de vida, querida amiga!...
    Obrigada por este comentário, beijos e boa noite.

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  12. Maria Tereza

    Saber e poder recomeçar leva-nos a caminhos mais seguros e mais iluminadps.
    Beijos e boa noite

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