Joana vai acordando aos poucos, lembrando-se de que era sábado... A noite mal dormida deixara atrás de si um certo desconforto, um quê de cansaço travando-lhe os músculos. Antes mesmo de abrir os olhos, ouvindo o estridente canto dos bem-te-vis que habitavam as árvores do condomínio, adivinhou uma manhã de muito sol, típica do mês de julho, clara e fria. E vieram-lhe à mente manhãs como essa vividas décadas e décadas atrás, manhãs dos sábados de sua infância, tempo em que ainda havia aulas nos dias de sábado, mas que para as crianças sempre eram de alegria porque lembrava-lhes que o dia seguinte seria especial, com farto almoço de domingo em família e, logo depois, uma deliciosa tarde no cinema do bairro, para uma alegre matinê infantil junto de suas amigas. Depois vieram as manhãs de sábado de sua adolescência, cheias de sonhos e frustrações, antevendo domingos com tardes descontraídas entre jogos e passeios nas calçadas da rua em que morava, no lindo parque, junto às margens do rio que ainda não sabia o que era poluição. E os sábados da juventude, em expectativa para o encontro com o namorado ao anoitecer para umas voltas pelo quarteirão antes do bate-papo na porta de casa, sempre vigiados pelo irmão menor, que o pai colocava de plantão para evitar "abusos" de confiança. Já casada, o acordar com o choro do neném, o levantar-se cheia de frio para alimentá-lo e trocar as fraldas e, depois de aninhá-lo novamente em seu berço, retornar para os braços fortes que a esperavam, o calor da paixão a aquecer-lhe a alma. E os sábados foram mudando de cara, fase após fase de sua vida. Na maturidade, filhos casados, cada qual cuidando de sua vida, sábados de calma e companheirismo, manhãs de acordar envolta em braços ainda fortes, de longas conversas antes de resolverem sair da cama. Ainda tantos planos, tantos sonhos, tanto amor...
Difícil foi enfrentar os sábados que vieram depois, de acordar e não sentir o calor do abraço matinal, o estender as mãos em direção ao outro lado da cama e só encontrar o vazio... O mesmo vazio que se instalara em seu coração, que esmigalhava sua alma, que encobria a mais pura luz do sol... E o tempo foi passando, amenizando levemente sua dor, trazendo conforto à sua alma... O tempo! Ah, não fora o tempo!...
Sentiu lágrimas tentando descer pelo rosto e pensou que era bem hora de abrir os olhos para o dia que começava. Uma réstia de luz entrava pela janela entreaberta, janela que ela abriu de par em par, deixando que o sol invadisse o quarto. Como ficar triste numa manhã como essa? Ainda mais que era dia de receber os netos e o filho para o final de semana. Sacudiu as lembranças, abriu um sorriso largo e mergulhou na vida e em tudo o que ela ainda tinha o privilégio de dela receber. Afinal, era sábado!...